Os espinhos - poema de marcos samuel costa

 

Os espinhos

 

Quando voltei da visita na UTI

comprei um cacto no supermercado.

Não era a intenção levar uma planta para casa.

Mas o trouxe. Como se carregam aspectos de

Vida nas mãos. Só agora percebo a intenção.

Ele estava tão seco quanto eu. Precisava de vida

Tanto quanto eu. As mortes são precisas.

Não erram os alvos, Dulce, já se deu conta disso?

Nesses últimos dias e meses, talvez tenhamos

nos atraído por nossas próprias securas.

Pelas solidões e excessos. Esse vazio escuro. Amplo.

Que martela na memória. Com força, com força.

A ansiedade da procura quebra os ossos,

Os espinhos que tentam sangrar os dedos.

Os sangram. Os ferem. Morremos.

O cheiro da UTI que parece ficar no corpo o resto do dia.

Os sons dos aparelhos constantes

Não é música, são gritos. Os escuto até aqui gritando.






Marcos Samuel Costa, é poeta e ficcionista, autor dos livros: No próximo verão (ed. Folheando, 2021), Os abismos (Ed. Folheando, 2021) e do romance Dentro de um peixe (
ed. Folheando, 2019) e do romance O cheiros dos homens (Prêmio Dalcidio Jurandir).

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